quinta-feira, 27 de maio de 2010

O Tamanho da Brincadeira


A indústria de games, sabe-se bem, já é uma das mais importantes do mundo em diversos aspectos, do financeiro ao cultural. Os principais títulos da atualidade envolvem orçamentos milionários, campanhas massivas de marketing e lançamentos recheados de hype. Bem, como todas as coisas no mundo, isso nem sempre foi assim.

Estive jogando Metal Warriors, um game que nunca alcançou a fama que merecia (rendendo-lhe certo status de cult). Exclusivo de Super Nintendo, foi desenvolvido pela Lucas Arts e lançado pela Konami 15 anos atrás, em 1995. Tinha gráficos bons; um design de jogabilidade e levels extremamente interessantes; a presença de elementos sofisticados; um modo versus viciante; e a dificuldade insana típica dos games mais antigos. Depois de 15 anos, finalmente consegui passar as nove missões cabeludas e chegar ao final deste game que recebeu nota 8.1 da EGM. (Veja a gameplay aqui)

Eis que, acostumado aos créditos hollywoodianos dos jogos atuais, me deparo com a seguinte sequência de créditos:

Contando nos dedos de cinco mãos

Sim, é isso aí: 24 pessoas participaram da produção do game. Sendo que, destas, onze eram ligadas aos testes. Excluindo oprodutor e o responsável pelo suporte técnico, temos 11 pessoas!  

Agora vá neste link aqui e compare com a equipe da Infinity Ward envolvida na produção de Call Of Duty: Modern Warfare 2. Mais de 200 pessoas, sem nem contar os funcionários das empresas envolvidas em outsourcing, nem os da Publisher Activision, que somaria mais de 300. É gente pra cacete.

Segundo este artigo do LA Times, a produção saiu por algo entre US$ 40 e 50 milhões. Mas é na hora do lançamento – e sua devida campanha de marketing – que os really big bucks aparecem: o gasto chega a US$ 200 milhões. É, orçamento hollywoodiano – e de blockbusters.

Bom, em apenas uma semana, o game vendeu nada menos que quase 4,9 milhões de cópias. (Esse valor) x (US$ 60 por cópia) x (45% explicado neste post) US$ 119 milhões. Na terceira semana de vendas, o produto já havia se pagado. Depois, amigo, é só alegria.

É quase assustador pensar que uma indústria de trinta anos de idade já movimente tanta gente, força de trabalho, e, sobretudo, dinheiro. Com isso, tornou-se extremamente complexo desenvolver um jogo - assim como complicou-se a tarefa de jogá-lo, repelindo toda uma gama de pessoas.

O surgimento, então, dos jogos mais baratos, simples e fáceis de fazer – para celulares, web, independentes, sociais e os casuais em geral – parece algo natural (agora que já surgiram, é fácil falar, mas enfim). Tal aparição se posiciona, para desenvolvedores, como uma válvula de escape ao colosso da indústria focado nas superproduções, agindo no mercado de maneira semelhante à das produções não-hollywoodianas no cinema.

Como a tendência é este cenário de investimentos monstruosos (e resultados correspondentes) se manter por um bom tempo, podemos esperar que o ciclo de blockbusters nos games, que já segue os moldes do cinema, caia cada vez mais neste formato: ênfase em franquias consagradas (Guitar Hero, Super Mario Bros. e o próprio CoD que o digam) e pouco espaço para inovações em títulos de ponta, como Metal Warriors em 1995. 


Será que cabe aos estúdios pequenos e aos independentes preencher a lacuna criativa que resulta de toda essa equação?

quarta-feira, 10 de março de 2010

Raio-X dos Xbox Live Indie Games

São zilhões de jogos independentes, de massagem via vibração do controle à matança de zumbis. Este é o primeiro post do blog de uma série sobre Xbox Indie Games: uma verdadeira aventura pelo vasto e obscuro mundo da liberdade de programação

É universal a defesa da liberdade. Pretexto inclusive para guerras que não necessariamente tem o objetivo de garantir independência, ter liberdade é, basicamente, ter permissão para se fazer qualquer coisa. Segundo a melhor amiga para consultas virtuais, é condição do comportamento humano voluntário. No mundo do desenvolvimento de Games, a concepção e percepção de liberdade se assemelham muito às das demais indústrias do entretenimento e artes: é poder expressar aquilo que você deseja na sua obra sem interferências de forças externas, principalmente do direcionamento do mercado.  


Os jogos independentes gozam dessa liberdade. Uma pessoa, uma dupla ou até mesmo um pequeno estúdio desenvolvem um jogo simples, de ciclo curto, para vender por valores pequenos - de US$ 1,00 a US$ 15,00 - em serviços de distribuição digital como a Playstation Network, o Steam, a App Store ou a Xbox Live. E, nesse sentido, a Live oferece condições ainda melhores ao independente, já que o kit de desenvolvimento é gratuito (XNA + Visual C# Express) – para outras plataformas, custam milhares de dólares - e a licença para publicar na plataforma custa US$ 100,00 por ano. Acessibilidade, oh yeah!

Neste modelo adotado pela Live, qualquer moleque pode fazer seu game em XNA e mandar para a avaliação da comunidade, eventualmente chegando ao consumidor final sem maiores barreiras no canal Xbox Live Indie Games – eis a grande diferença para a PSN. E qual o resultado disso? Uma verdadeira avalanche de games - dos mais diversos tipos, das mais distintas qualidades.



Vamos lá: na noite de 09 para 10 de março, eram nada menos que 832 jogos lançados desde 19 de novembro de 2008, quando os então Community Games entraram no ar. Média estonteante de 1,75 jogo por dia. Como se pode imaginar, muito, mas muito lixo está aí no meio. Inclusive muita coisa que não deve sequer ser considerada jogo. Mas como separar o joio do trigo?

Bem, os jogos são avaliados pela própria comunidade e pelos jogadores, que dão de uma a cinco estrelas ao game. O sistema é falho, uma vez que não é preciso comprar o jogo completo para avaliar. De toda forma, serve como uma base para traçar a anatomia dos Xbox Live Indie Games:


Como se vê neste belíssimo gráfico produzido por mim, a imensa maioria está na faixa da ruindade/mediocridade – duas a três estrelas. Vale lembrar que não é possível avaliar com zero estrelas, então a nota mínima é um – o que coloca estas notas abaixo da média para passar de ano (tirar cinco na escola seria tirar três aqui). Uma fatia considerável mostra jogos competentes, acima da média, e apenas míseros 2% - um total de 13 games – ostentam nota acima de quatro estrelas.

Para efeito comparativo, os jogos convencionais, AAA, também são avaliados pelos jogadores. OK, é uma grande várzea: games que nem foram lançados já podem receber avaliações (Halo: Reach é o melhor avaliado). Isso dá margem a muito fanatismo e compromete essas notas bem mais do que as dos Indie Games, que despertam o interesse de um publico muito mais restrito e potencialmente crítico do que fazem os jogos blockbuster. De qualquer forma, aos dados:



É notável a brutal diferença no volume de jogos na melhor fatia da pizza. Mesmo tirando uma margem grande de erro, já que existe muito bairrismo e fanatismo envolvido, segundo o Metacritic, 294 jogos de 360 receberam notas acima de 7,5.

Isso significa que os Indie Games ainda precisam passar por um processo de amadurecimento até chegar a um patamar mais interessante. Os bons games são raras exceções. Embora alguns sejam incríveis surpresas, a grande maioria é absolutamente irrelevante, transitando do horroroso ao bizarro, passando pelo idiota e tudo o mais.

Só o tempo irá confirmar, mas tudo indica que há muito espaço para desenvolvedores sérios e criativos se destacarem no meio da avalanche de títulos. Colocar um jogo com conteúdo divertido e execução precisa pode, sim, fazer deste canal um trampolim para os holofotes do mercado. A meritocracia há de promover a seleção natural na Xbox Live Indie Games.

sábado, 27 de fevereiro de 2010

Os US$ 60 do seu novo game

Saiu no Los Angeles Times um artigo sobre o que acontece com as 60 doletas que se paga em um game novo para consoles lá nos EUA - de Xbox 360 ou PS3, porque os de Wii custam US$ 50. Veja no gráfico abaixo:

Traduzindo bem rapidamente: a loja leva US$ 15 (25%); a dona do console (Sony, Microsoft) leva US$ 7 (11,5%); US$ 4 (7%)são gastos para fazer a mídia, distribui-la e divulgá-la; são gastos US$ 7 (11,5%) com retorno das unidades que encalham; e os outros US$ 27 (45%)ficam com a publisher, que é a grande companhia que publica o jogo – algo como as gravadoras já foram na indústria fonográfica ou as editoras são no mercado editorial. Vale lembrar que, nos EUA, o imposto não é embutido, mas sim pago no ato da compra.

O desenvolvedor supostamente fica com uma fatia de cerca de 20% deste lucro da publisher. Há quem diga que pode chegar a 40%, supondo que a desenvolvedora conseguiu um acordo dos céus com uma Eletronic Arts ou Activision da vida.

Vamos lá: 40% de US$ 27 = US$ 10,80. É, ainda assim, realmente ridícula a fatia do desenvolvedor. Se for 20%, então, cai para US$ 5,40 por cópia. As Publishers agem, hoje, como as gravadoras de música agiram até a morte do CD - e estão cavando a própria cova da exata mesma maneira que as irmãs defuntas. 




O pior é que as publishers sabem disso. Mas, ao invés de mudar as suas políticas e buscar novos modelos de negócio, estão usando a mesma estratégia (errada) de espremer até a última gota um modelo esgotado que vai sucumbir em breve. E, assim, as desenvolvedoras já começam a encontrar alternativas.

A distribuição digital tem potencial para acabar com essa várzea do mesmo modo que fez na música, controvérsias à parte. A questão é: em quanto tempo será viável baixar um software de 25 gigas, o tamanho padrão de um disco blu-ray? Não muito. Hoje, já se baixa títulos completos online na rede Xbox Live – tirando da jogada os 25% da loja física, os 11,5% dos retornos e parte dos 7% investidos em mídia e logística. E mais do que isso: praticamente dispensando a presença da publisher, uma vez que o game vai online diretamente do desenvolvedor para o consumidor.

A Microsoft, que de boba não tem nada, acabou por atravessar as publishers ao criar o Games On Demand, canal de distribuição direto via Xbox Live. E foi além: pega uma fatia de 33% em cada game publicado nos Xbox Live Indie Games, o caminho mais curto, simples e barato para qualquer desenvolvedor de garagem colocar seu game no mundo. Como se fosse um MySpace de games, não de música.



O cara que criou o game e publicou nos Indie Games – sim, muitas vezes é um único cara, ou uma dupla - fica com os outros 67% líquido. Faça as contas: se vende o game por US$ 5, já embolsa US$ 3,30 - contra os US$ 5,40 a US$ 10,80 do varejo convencional. Sem precisar necessariamente trocar uma palavra com qualquer publisher.


É claro que o capital das publishers ainda é condição para financiar o desenvolvimento de jogos blockbuster top de linha. Mas até quando?